quinta-feira, 28 de maio de 2009

Contingências


Se alguma coisa é espantosa, se existe uma realidade que ultrapassa o sonho, é isto, ver o sol, entrar em plena posse da força viril, ter saúde e alegria, rir abertamente, correr em direção a uma glória resplandescente que temos diante de nós, sentir no peito um pulmão que respira, um coração que pulsa, uma vontade que raciocina; falar, pensar, ter esperança, amar, ter mãe, ter mulher, ter filhos, ter aluz, e, de repente, em menos de um minuto, o tempo de um grito, afundar em um abismo, cair, rolar, esmagar, ser esmagado; ver as astes do trigo, flores, folhas, ramos, sem pode agarrar-se a nada, sentir inútil sua espada, sentir homens por baixo de si e cavalos por cima, debater-se em vão, os ossos quebrados por algum coice na escuridão, sentir um calcanhar que lhe faz saltar os olhos,morder com raiva as ferraduras dos cavalos, sufocar, berrar, se retorcer, estar lá embaixo e dizer: ainda há pouco eu estava vivo.
Os miseráveis, Victor Hugo, pag.352.

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