terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Auto-engano


Minha mãe sempre repetia, antes só do que mau acompanhado, a bíblia ensina-me''aquele que se isola busca seu próprio interesse”, no decorrer da vida percebi que minha mãe não estava errada, nem a bíblia.


Algumas companhias não eram boas, mesmo sendo uma pessoa livre de opinião, sempre existia aquela pressão, o comportamento adequado para pertencer ao grupo. Me afastei conscientemente das influências que derrapavam em si mesmas, sem o prévio conhecimento bíblico certifiquei-me posteriormente que estava impregnado do meu próprio interesse, até ai normal pois buscava melhoria de vida, e essa melhoria estava muito além daquele grupo que tinha interesses antagônicos aos meus, passei a andar só, não sozinho, mas só nos ideais.


Passado alguns anos tive alguns contatos esporádicos com aqueles antigos amigos, alguns vivos outros mortos, alguns iguais outros diferentes, mas ainda tínhamos laços de amizade, algumas idéias, ou resto de semelhanças. Convertido ao cristianismo e servindo ignorantemente a um pastor e a uma igreja medíocre de sensibilidades, tornei- me mais um anjo da insensibilidade, como uma lixa áspera lixava e nem me lixava para ninguém, meu umbigo era a região mais longe em que realmente depositava preocupação, alcancei níveis de espiritualidade que exploravam mais a imaginação do que a realidade, obtive reconhecimento dentre os irmãos por falar constantemente em línguas estranhas, pois sutilmente fui ensinado que quem assim procedesse teria destaque na igreja como pessoa abençoada, iluminada, inspirada e espiritualizada.


Era uma ilusão enraizada e permanente nas tradições evangélicas o falar em línguas, as performances no púlpito, as pregações subjetivas que claramente só lançava mais trevas sobre quem as ouvia, as orações com interesses de vaidade pessoal, as manobras sócio-políticas, a gravata, o terno, o carro cheirando a perfume celestial, o dízimo que estufava o envelope, a frequência no culto e a pontualidade eram sinônimos de pontuação e de ganho no currículo espiritual e contribuíam para sofisticar minha performance como membro elevado nessa organização religiosa.


É um ambiente neurotizante, que transfere sua neurose para os desavisados, importa uma teologia americana de riqueza e propriedade como forma de prosperidade, padronizando em termos mercantilistas toda sua liturgia, acentuando que, as melhores virtudes são: compromisso, contribuição, responsabilidade, constância nos programas e eventos de arrecadação, e tudo isso não puramente, mas sempre girando em torno da igreja, do pastor e da placa que fica sobre suas portas, e costas.


Os evangélicos e suas igrejas, são ou se tornaram hoje, a universal ilusão descrita por Nieztsche, o novo testamento é o seu pior pesadelo como disse Kierkegaard, e a pedra de tropeço é o próprio Jesus.


Supersticiosos, anônimos nas causas sociais, avarentos, racistas, autores do desmantelamento familiar, quando mulheres e crianças, adolescentes e jovens sufocam agonizando na doutrina do: mantenham-se longe do mundo, indiscretos, torturadores da vida quando afogam o livre pensar e o bom senso nas águas mórbidas da clausura existêncial, alegram-se com todos os bancos e cadeiras, com a extenção do templo, com o som amplificado, com o microfone shure sem fio, com a soma mensal que sumarizam suas reais intenções, expulsam o pecador hediondo, criam metas numéricas nos atos de evangelização, suprimem a fraqueza daqueles que se confessam inadequados para esses mecanismos, arquitetam o testemunho mais convincente e comovente, é um auto nível de um auto-engano, e quando pessoas se sentem incomodadas com esse sistema, os rótulos são: doentes, traumáticos que não sabem viver, insubmissos e possessos que não entendem nada.


Não defendo os sem igreja, mas vejo que eles não estão errados, pois pertencer a uma igreja desconfiando que a relação com o novo testamento é só teórico, e mais, teorias totalmente incompatíveis com a realidade, não é de admirar sua insatisfação. Não são doentes, não na concepção que pastores os vêem, mas sua doença é a angústia em ver destorcida a verdade do evangelho, por isso andam só, não sozinhos, mas só nos ideais.


Ao pensarem que estão sozinhos, enganam-se, ao pensarem que estão buscando o próprio interesse também enganam-se, pois o futuro da igreja institucional é esse mesmo, sua irrelevância.

Não estão só os desiludidos com a igreja institucional, e não buscam seu próprio interesse afastando-se dela.

João Neto.

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